A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) alterou a entrada em vigor da Resolução CVM n° 215 para 1º de outubro. A resolução foi publicada em 29 de outubro de 2024 e estabeleceu um novo regime, mais simples, para as ofertas públicas de aquisição de ações (OPA), introduzindo inovações baseadas na jurisprudência do Colegiado e em parâmetros internacionais.[1] Originalmente, essa Resolução entraria em vigor em 1° de julho de 2025.[2]
Ritos de Registro: ordinário e automático
Dentre as mudanças trazidas pela Resolução CVM nº 215, destaca-se a instituição de dois ritos de registro para as OPA.
O rito ordinário de registro se aplica às OPA obrigatórias e às facultativas que envolvam permuta de valores mobiliários, inclusive as ofertas mistas e alternativas, e se assemelha ao que vigorava anteriormente.
Esse procedimento exige a observância de uma série de requisitos para a obtenção do registro e está sujeito à análise prévia da área técnica responsável por sua concessão, qual seja, a Superintendência de Registro de Valores Mobiliários da CVM (SRE).
As OPA obrigatórias abrangem as relativas a: (i) cancelamento de registro, (ii) aumento de participação, e (iii) alienação de controle. As demais, voluntárias, são consideradas OPA facultativas.
O rito automático de registro, por sua vez, aplica-se às OPA facultativas que não envolvam permuta de valores mobiliários, dispensando a análise prévia da SER, desde que cumpridos determinados requisitos e procedimentos.
Consultas Sigilosas
Uma inovação da norma diz respeito à possibilidade de consultas sigilosas sobre caso concreto que envolva uma OPA. Para tanto, o consulente deve enviar todos os dados para a análise do caso, não sendo admitido o tratamento confidencial a consultas meramente teóricas. Além disso, deve ser apresentada justificativa para o sigilo, incluindo os motivos pelos quais a divulgação poderia representar vantagem competitiva a outros agentes econômicos ou pôr em risco interesse legítimo do ofertante, da companhia objeto da OPA ou de terceiros.
O sigilo se mantém até 6 meses após a manifestação da CVM sobre a consulta, sendo certo que caso a informação escape de controle ou ocorra oscilação atípica nos valores mobiliários, o interessado deverá divulgar imediatamente ao mercado a informação para a qual foi concedido tratamento sigiloso.
Dispensa do Laudo de Avaliação
A nova norma possibilita que o preço da oferta em uma OPA seja determinado sem um laudo de avaliação. O preço ofertado para as ações pode ser determinado a partir das seguintes hipóteses alternativas:
- Preço de negócio jurídico realizado há no máximo 12 meses, contados retroativamente da data do requerimento de registro da OPA;[3]
- Maior cotação unitária atingida pela ação da mesma espécie e classe das ações objeto da OPA na bolsa de valores em que houver o maior volume de negociações das ações de emissão da companhia durante o período de 12 meses, contados retroativamente da data do requerimento de registro da OPA;[4]
- Preço que o ofertante estiver disposto a pagar, considerando que se trate de OPA para cancelamento de registro unificada com OPA para aquisição de controle;[5] ou
- Preço pelo qual acionistas titulares de mais de 1/3 das ações em circulação tenham se comprometido a vender.[6]
Leilão da OPA
O leilão fica dispensado quando a OPA for destinada: (i) a menos de 100 acionistas (baixa dispersão acionária); ou (ii) a menos de 1000 acionistas e o custo do leilão corresponda a mais de 10% do valor total da OPA (custos desproporcionalmente elevados considerando o valor da oferta).
Se houver leilão, o prazo mínimo para a sua realização será de 20 dias (diferentemente dos 30 dias do regime anterior); e o prazo máximo é de 45 dias, ambos contados do lançamento da OPA. É necessário, ainda, observar as regras estabelecidas pela entidade administradora do mercado organizado em que se realizará o leilão.
Unificação de OPA
Passa a ser admitida a unificação de procedimentos de OPA, de modo a permitir ao ofertante formular apenas uma única OPA com o objetivo de abranger mais de uma modalidade.[7] Para tanto: (i) os procedimentos devem ser compatíveis; (ii) a unificação não pode acarretar prejuízos para os destinatários da oferta; e (iii) a OPA deve ser formulada a preço que satisfaça os requisitos de todas as modalidades a serem aglutinadas, sendo possível incluir mais de uma opção de pagamento.
OPA por aumento de participação
A CVM alterou a metodologia de cálculo para verificar se a OPA por aumento de participação é obrigatória. Anteriormente, o critério era a aquisição de ações representativas de 1/3 do total das ações de cada espécie e classe em circulação. Com a nova Resolução, a OPA por aumento de participação será obrigatória sempre que o acionista controlador ou pessoa a ele vinculada adquirir ações em circulação que levem a uma redução do total de ações em circulação de uma mesma classe e espécie a um patamar inferior a 15%.
OPA para cancelamento de registro
A regra geral contida na Resolução CVM n° 215 para o cancelamento do registro requer a aceitação da OPA ou concordância com o cancelamento por acionistas titulares de ações que correspondam a mais de 2/3 das ações elegíveis. A regra prevê, contudo, a possibilidade de ser o quórum reduzido para maioria simples quando a quantidade de ações em circulação da companhia for inferior a 5% do capital social.
Adicionalmente, mesmo que o quórum de aceitação de 2/3 não seja atingido é permitida a aquisição das ações desde que haja previsão nesse sentido no instrumento da OPA, observadas, ainda, as seguintes condições: permaneçam em circulação 15% ou mais do total de ações da mesma espécie e classe das ações objeto da OPA, com possibilidade de rateio entre os aceitantes, se necessário; ou o ofertante se comprometa a adquirir as ações em circulação remanescentes, da mesma espécie e classe, pelo preço final da OPA, no prazo de 30 dias contado da data do leilão ou do prazo final para adesão, caso após a conclusão da OPA permaneçam em circulação menos de 15% do total de ações da mesma classe e espécie da OPA.
Estas são, em apertadíssima síntese, as principais alterações promovidas pela Resolução CVM 215.
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[1] A Resolução CVM nº 215/2024 revogou a de nº 85. Em consequência, foi editada, na mesma data, a Resolução 216, apenas para adaptações pontuais a poucos dispositivos das Resoluções CVM nº 13, de 18 de novembro de 2020, nº 20, de 25 de fevereiro de 2021, Resolução CVM nº 44, de 23 de agosto de 2021, e nº 77, de 29 de março de 2022
[2] V. Resolução CVM nº 230, que também postergou, para a mesma data, a vigência da Resolução nº 216.
[3] Desde que: (a) os agentes que celebraram o negócio jurídico não sejam partes relacionadas; (b) envolva quantidade de ações igual ou superior a 20% do capital social da companhia objeto; e (c) não esteja associado a outro negócio jurídico em que as partes envolvidas na transação ou pessoas a elas vinculadas tenham auferido ou venham a auferir outras contrapartidas financeiras.
[4] Desde que: (a) a companhia esteja adimplente com a entrega de informações periódicas e eventuais; e (b) as ações objeto da OPA tenham sido negociadas em ao menos 95% dos pregões e apresentado volume de negociação médio diário igual ou superior a R$ 10.000.000,00.
[5] Desde que a quantidade de ações cuja aquisição seja necessária para o sucesso da OPA para aquisição de controle seja igual ou superior a 20% do capital social
[6] Desde que tal compromisso de venda não esteja associado a outro negócio jurídico com outras compensações financeiras.
[7] Caso haja acionista controlador definido antes da realização das OPA, as ações alienadas por esse acionista ou pessoa a ele vinculada na OPA para aquisição de controle não serão contabilizadas para o quórum de sucesso da OPA para cancelamento de registro (art. 36, §5º da Resolução CVM nº 215).